"Não dá para viver de música se você não é axé ou sertanejo", lamenta ex-tecladista de banda oitentista

ESPREMENDO A LARANJA: Essa declaração mostra a realidade em que nós nos encontramos. A música de qualidade está infelizmente marginalizada, sob o rótulo de "intelectual", mas no sentido pejorativo. O povo mesmo gosta é de futilidades, seja o paupérrimo popularesco (axé, pagode, "sertanejo", "funk", brega e derivados), o rock engraçadinho (inclui Mamonas, emos e quejandos) ou a dance-music norte americana tratada aqui como "maravilhas da cultura atual" norte-americana, que impesteiam o hit-parade exportado de lá para os países de terceiro a quinto mundo.

O Metrô pode até não ter sido uma das melhores bandas dos B-Rock oitentista*, mas tinha a sua qualidade musical, com um ótimo álbum (Olhar) e bons instrumentais valorizados por uma mixagem de nível internacional. Aliás, o Metrô é na verdade uma banda brasileira formada exclusivamente por estrangeiros, já que os integrantes, parentes de diplomatas, têm ascendência francesa.

Por onde anda o Metrô, que cantava o tema da primeira versão de 'Ti-ti-ti'?

Barbara Duffles Do EGO, em São Paulo
25/07/10 - 13h36 - Atualizado em 25/07/10 - 13h36

Integrantes abandonaram o ramo musical. 'Não dá para viver de música se você não é axé ou sertanejo', lamenta tecladista.

A música-tema de “Ti-ti-ti”, de Rita Lee e Roberto de Carvalho, voltou com tudo na voz da própria cantora, na atual versão da novela. Mas ficou conhecida mesmo em 1985 na interpretação da banda Metrô, que cantava o sucesso na novela original. Na época, era a bateria eletrônica e um leve sotaque francês que serviam de pano de fundo para as impagáveis brigas entre Jacques Leclair e Victor Valentim.

O charme do grupo vem de seus integrantes (Virginie Boutaud, Yann Laouenan, Alec Haiat, Dany Roland e Zavie Leblanc) de ascendência francesa que estudaram juntos no Liceu Pasteur, em São Paulo, e daí formaram a banda. Primeiro com o nome de Gota Suspensa, que fez algum sucesso no circuito alternativo, misturando rock e MPB. Depois, batizada de Metrô, a banda ganhou toques oitentistas com sintetizadores e bateria eletrônica.

A voz doce e afrancesada da bela vocalista, Virginie – chamada de "a coisa mais linda da televisão" por Chacrinha -, ajudou a consolidar o sucesso da banda.

O Metrô estourou com “Beat acelerado”, “Tudo pode mudar” e “Ti-ti-ti”. Com a música “Johnny Love”, Virginie e companhia fizeram uma participação no filme “Rock Estrela”, cantando ao lado de Leo Jaime.

Mas para um grupo que começou a tocar por diversão depois das aulas do colégio, o sucesso teve um peso. Shows sete dias na semana, viagens e pressão comercial acabaram desgastando a relação entre os integrantes. Criticados por alguns por não falarem de “assuntos sérios” como abertura política e afins, eles resolveram mudar o discurso, indo pelo mesmo caminho de Cazuza e Legião Urbana. Mas Virginie não concordou e acabou “demitida”.

O Metrô seguiu com novo vocalista, Pedro Parq D’Orey, mas não fez sucesso depois da saída de sua musa. Virginie, por sua vez, lançou um disco solo e teve uma faixa na trilha da novela “Fera Radical”. Não passou disso.

"Não dá para viver de música no Brasil", diz tecladista

Com o tempo, cada um foi seguindo seu caminho. Virginie casou-se com um diplomata francês e morou em diversos países da África – hoje vive em Madagascar, onde ensina francês. Alec abriu uma empresa de importação de instrumentos musicais. Dany (lembra dele no comercial da USTOP? "Bonita camisa, Fernandinho..."), casado com a atriz Bia Lessa, trabalhou com cinema, teatro, produção musical e hoje também atua como DJ. Zavie tornou-se chef e proprietário do elogiado bistrô francês La Tartine, em São Paulo.

Yann continuou no ramo musical, tocando com Paulo Ricardo por seis anos. Mas, há dois meses, largou tudo para trabalhar em uma construtora e lamenta ser muito difícil viver de música no Brasil fora do ramo do axé e do sertanejo. “Fiz o tema do ‘BBB’, trilhas de novela e de filmes, como ‘O Invasor’, tenho sete discos gravados. Mas até há pouco não tinha conseguido trocar meu carro 1.0. Tenho 47 anos, não dá mais para ficar brincando de bandinha”, disse Yann, sem esconder a revolta com o meio musical no Brasil.

Segundo Yann, mesmo anos após o fim, os integrantes do Metrô continuam em contato. “Nós nos conhecemos no colégio, é uma amizade de muitos anos”. Em 2002, ele, Virginie e Dany chegaram a se reunir para lançar o álbum “Déjá vu”, com versões em estilo “bossa-nova eletrônica” de “Beat acelerado" e "Johnny Love".

O disco, independente, teve participação de Preta Gil, Otto, Wally Salomão e Jorge Mautner, e foi gravado no Rio em clima família, rodeado pelos filhos dos integrantes. O trabalho foi elogiado pela crítica, mas não serviu para reunir definitivamente os músicos, que continuaram seguindo os próprios caminhos. “Foi um disco que pagamos para fazer”, disse Yann.

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* NOTA: Na verdade, existiram dois Metrôs: um é o famoso, liderado pela bela Virginie, constantemente comparado ao Kid Abelha, e que gravou o álbum "Olhar", de 1985. Sua sonoridade é o new wave descompromissado, com letras lúdicas e bem alegres e totalmente feito para dançar e se divertir.

Outro é o que gravou "A Mão de Mao" dois anos depois, com a mesma formação, só que com o português Pedro Parq (outro estrangeiro?!) no lugar de Virginie. Teria um nome diferente (Tristes Tigres), mas a gravadora (Sony Music) exigiu que os integrantes mantivessem o nome "Metrô". O som era mais intelectualizado, meio depressivo, misturando influências dos Secos e Molhados com a fase oitentista do King Crimson. Não fez sucesso de vendas, apesar das boas críticas. Meu irmão Alexandre tem o cd do álbum "Mão de Mao".

Ambas as fases são excelentes. Apesar de diferentes, as duas encarnações da banda tinham preocupação com a qualidade musical.

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