A inversão de valores culturais dos anos 80



Muita gente considera os anos 80 como a década mais ridícula de todos os tempos. De certa forma isso é verdade. Mas fala-se sobre os anos 80 como se a década fosse 100% ridícula. Felizmente não era.

Mas a memória curta da maioria de nossos jovens, pouco afeitos a decorar datas e a investigar sobre o passado, que acabam assimilando o que a mídia de hoje fala sobre a tal década, criando mitos, forjando fatos e distorcendo conceitos, além do mais grave: invertendo valores.

Ou seja, o que era realmente genial nos anos 80, como Peter Gabriel, Suzanne Vega, Bruce Springsteen e The Smiths (liderados pelos intelectual Morrissey), acaba esquecido ou não sendo levado a sério enquanto muita tolice da época é louvada como "o fino da arte", como se coreografias e caras e bocas, protagonistas que coadjuvaram a musiquinhas medíocres compostas por executivos de gravadoras, pudessem passar grandes lições culturais.

Hoje, virou moda endeusar o hit parade estrangeiro, como se fosse a "cultura superior", em detrimento dos verdeiros artistas que, por fazerem uma música não-palatável e de conteúdo intelectualizado, acabam por entediar um público que sismou que no lazer não se pensa.

Todavia, como posar de "inteligente" "fica bem na foto", mas ouvir música inteligente é muito tedioso, o jeito é tomar o velho fast food musical como "inteligente", como se para ser "inteligente" não precisasse de fato ser inteligente. Só vender muitos discos, aparecer de maneira insistente na mídia e seduzir muitas pessoas, incluindo gente influente. E Bingo! todos posam de "culturais" sem precisar valorizar cultura nenhuma.

E assim a historiografia da música se torna distorcida, colocando fajutos no lugar de heróis e alimentando a equivocada ideia de que a música para ter o seu valor deve se divorciar definitivamente do intelecto, recuperando a ingênua alienação dos anos 40 e 50 que foi muito combatida pelos jazzistas de então e assimilada pelo rock na segunda metade dos anos 60, para voltar gradualmente a ter força nas décadas seguintes.

Os anos 80 seriam os novos anos 60, mas a mídia não deixou

Nos anos 80, algumas lições dos anos 60 começaram a ser recuperadas pelos artistas mais intelectualizados, sobretudo no universo alternativo. Enquanto a midia oficial desfilava laquês e muitas coreografias para encher o estoque da recém criada Music Television (MTV), outros intérpretes, mesmo fazendo clipes (divulgar é preciso), nunca colocavam o visual acima da música, usando os clipes apenas como fundo para ilustrar as inspiradas cantorias.

Já os nomes do hit parade, como os hoje endeusados Madonna, Guns'n'Roses Michael Jackson, Whitney Houston, os últimos, já falecidos, faziam o posto: usavam os clipes, coreografias e maquiagens/roupas como prioridade, usando as medianas músicas sem poesia ou lições apenas como fundo para todo o aparato visual. Como a visão é o sentido mais apurado no ser humano, ficou fácil saber quem conquistou mais público.

Enquanto os nomes intelectualizados, embora ainda com uma grande quantidade de fãs, entram numa caminhada irreversível para o processo de eruditização, se tornando "música erudita", inacessível e até desconhecida do grande público, que carente de exemplos para definir uma cultura de verdade, toma os ídolos postiços no lugar dos verdadeiros, que acabam marginalizados por causa da música que só poucos conseguem entender.

Infelizmente, a compreensão da cultura estrangeira pelo brasileiro de hoje em dia caminha desta forma, enganando a todos, fazendo com que o simples gosto musical seja visto como o autêntico critério para definir quem tem valor cultural, invertendo as funções e contribuindo para que o intelecto da população nunca se desenvolva, com a humanidade presa numa eterna infância que nos faz ainda acreditar em falsos mestres e falsos gênios.

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