A morte da arte e o roubo do rótulo

Hoje vou fazer uma revelação. Observando friamente o que acontece no cinema e na música, concluo que infelizmente, a arte morreu. E pelas circunstâncias, pelo jeito não há mais volta: a possibilidade de uma ressurreição além de remota, só poderá ocorrer a longuíssimo prazo. A decadência cultural que se iniciou em 1990 se estabilizou de tal forma que a população e mídia em geral, já considera as armações da indústria cultural como a "verdadeira cultura". Isso é lamentável.

Pelo que parece, a falta de acesso da maior parte da população a verdadeira arte fez com que ela perdesse noção do verdadeiro sentido do que é arte e considerasse como tal, os produtos lançados pelas gravadoras e meios de comunicação. A coisa é tão grave que lembra uma simbiose entre parasita e hospedeiro, unidos de maneira vital: se separarem, ambos morrem. A arte virou refém simbiótico dos parasitas vindos da cultura-de-mercado.

Essa confusão entre arte e entretenimento (os tais produtos da indústria cultural) está transformando a cultura numa mistura heterogênea, onde aquilo criado apenas para mera curtição passa a ser tratado como algo supostamente sábio, que vai trazer lições para o futuro e merece ser eterno. É levar a sério uma bobagem que deveria durar no máximo 3 verões.

E o pior: as pessoas passaram a acreditar que há espontaneidade nos ídolos da indústria cultural, o que é não é verdade. Mesmo que surja espontaneamente, por conta própria, o ídolo-produto já está suficientemente "educado" pela indústria cultural, colocando em sua informação musical apenas aquilo que é difundido pela grande mídia, muitas vezes de qualidade duvidosa, deixando evidente a ausência total de uma educação musical, substituída pela ânsia de ser "respeitado" como ídolo, ignorando a própria falta de vocação.

Piorando cada vez mais: muitos dos produtos do entretenimento acreditam que estão fazendo espontaneamente, sem a intervenção de executivos de gravadoras e produtoras. A população acredita e o defende, como se as asneiras cantadas nestas músicas e encenadas nos filmes pudessem dizer alguma coisa edificante, que ajudasse a população a se tornar mais sabida. Com certeza que não. A espontaneidade deles é a do dinheiro fácil, conseguido às custas de muito lazer (os jogadores de futebol - outros popularescos - que o digam).

Hoje, para ser valorizado culturalmente, não precisa ter qualidade: é preciso fazer sucesso. A "qualidade" musical ou cinematográfica está na quantidade de pessoas que consegue atrair para si e a repercussão que possui nos meios de comunicação. Muitas vezes os mais vocacionados para o cinema ou para a música são os que menos fazem sucesso, ignorados por grande plateia. As músicas mais belas do mundo muitas vezes não aparecem nem sequer entre as 1000 mais ouvidas.

Enquanto no caminho oposto, um mecânico de automóvel, daqueles bem broncos, pode fazer uma cançãozinha chinfrim, evidentemente malfeita e ganhar o respeito da mídia, como criador de "supostas obras-primas" e fazer sucesso durante anos. Foi assim que surgiu o popularesco (axé, pagode, "sertanejo", "funk", brega e similares), que domina a indústria cultural brasileira de hoje, cujos produtos sonham em se impor como a "cultura oficial do Brasil" e que, apesar da qualidade muito mais do que discutível - ídolos sofrem críticas constantes - possui uma enorme popularidade, além da proteção dos barões da mídia, o que serve de embasamento postiço para que sejam respeitados como "arte".

O pop americano e o cinema idem, bastante respeitados no Brasil, fazem parte da indústria cultural. Não representam a verdadeira cultura dos EUA, embora se imponha como tal, por interesse dos donos da mídia de lá. A verdadeira cultura ianque não é fratamente exportada. Por isso, o desconhecimento do legítimo, faz as pessoas acreditarem que o falso é que é o legítimo. E o Brasil, tradicional imitador dos ianques, segue pelo mesmo caminho, legitimando o falso e colocando no lugar da esquecida cultura verdadeira de nossa nação.

E assim a nossa cultura verdadeira vai se agonizando, escondendo a sua cara, se limitando a nichos específicos e preso a redutos. E a população, ainda presa a um sistema educacional falho, com finalidade exclusivamente mercantil, totalmente baseado na erradíssima ideia de que inteligência é acúmulo de informação, continua a acreditar que os ídolos postiços que aparecem na TV são os verdadeiros representantes da cultura popular, perpetuando a ruindade cultural - que também acontece no cinema - que faz por desaparecer completamente as verdadeiras referências da cultura e na falta dessas referências perde-se a noção do que é a verdadeira arte.

E não compreender a verdadeira arte é o modo mais fácil de matá-la. Mas o tempo, juiz justo, não irá deixar os produtos vazios do entretenimento substituírem a arte. Ou será que vamos continuar eternamente a empinar nossos traseiros ao som das metralhadoras de filmes de ação?

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